UFSC identifica 35 contaminantes, incluindo cocaína, na Lagoa da Conceição

    Pesquisa teve colaboração do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA)

    Foto: Divulgação/UFSC

    Uma pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) identificou 35 contaminantes emergentes na Lagoa da Conceição, em Florianópolis. As concentrações mais altas apareceram perto da estação de tratamento da Lagoa de Evapo Infiltração (LEI), da companhia de saneamento. A pesquisa detectou cafeína, antibióticos, analgésicos e cocaína. O Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) ajudou a equipe, que recebeu financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa, Tecnologia e Inovação de Santa Catarina (Fapesc). A revista Science of the Total Environment publicou os dados.

    A pesquisa detectou a benzoilecgonina, principal metabólito da cocaína, e a própria cocaína nas amostras de água, sedimentos e biota. Outros testes confirmaram os resultados e expandiram a pesquisa. A benzoilecgonina apareceu em 63% das amostras, mostrando a presença constante da substância no ambiente. A cocaína também apareceu, indicando o descarte da droga. Estudos anteriores já encontraram essa contaminação em águas costeiras do Brasil, incluindo em tubarões, afetando vários níveis do ecossistema.

    Amostra no laboratório do Centro de Ciências Agrárias, em Florianópolis. Foto: Gustavo Diehl/Agecom/UFSC

    A professora Silvani Verruck, do departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos da UFSC, liderou o estudo. Ela iniciou a pesquisa após o rompimento da lagoa de tratamento em fevereiro de 2021, que causou inundações de esgoto em casas e ruas. O estudo faz parte do Programa de Recuperação Ambiental da Casan, criado para compensar os impactos do desastre.

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    Silvani explicou que o estudo avalia o impacto ambiental, monitora a recuperação do ecossistema e sugere formas de resolver os problemas causados. Ela destacou que algumas regiões sofreram alterações significativas na biota local, agravadas pelo crescimento populacional e pelo turismo. O estudo focou em contaminantes emergentes, como cosméticos, medicamentos e produtos de higiene pessoal, que não recebem tanta atenção quanto os agrotóxicos e metais pesados.

    Água potável

    A pesquisa também se conecta a uma preocupação mundial. Na Europa, países estão mais atentos aos contaminantes emergentes devido à escassez de água potável e buscam formas de eliminar esses resíduos.

    Para detectar os contaminantes, a UFSC usou um método inovador que identifica simultaneamente 165 substâncias. Luan Valdemiro Alves de Oliveira, um dos autores do estudo, explicou que o processo de identificação incluiu etapas de confirmação. A pesquisa utilizou cromatografia líquida acoplada e espectrometria de massas para realizar triagens qualitativas e quantitativas.

    Doutorando Luan Valdemiro Alves de Oliveira participou da pesquisa. Foto: Gustavo Diehl/Agecom/UFSC

    A equipe coletou amostras em pontos estratégicos da Lagoa da Conceição, incluindo áreas perto da estação de tratamento de esgoto e regiões urbanizadas e de maior biodiversidade. Luan afirmou que, embora não haja dados anteriores ao desastre, as áreas urbanizadas mostraram concentrações significativas de contaminantes, possivelmente devido ao impacto do turismo.

    A cafeína foi a substância mais concentrada, seguida por ciprofloxacina, antibiótico para infecções bacterianas. Clindamicina e diclofenaco também apareceram.

    Os contaminantes foram medidos em nanogramas, ou um bilionésimo de grama. No entanto, os pesquisadores se preocupam com a falta de uma métrica para definir uma concentração segura. Silvani comentou que, embora as concentrações sejam baixas, a exposição a várias moléculas preocupa a saúde a longo prazo.

    Animais também podem estar contaminados

    A equipe também avaliou os riscos ecotoxicológicos, revelando danos potenciais a organismos aquáticos. Compostos como diclofenaco e cafeína podem prejudicar algas, crustáceos e peixes. Esses contaminantes ameaçam a biodiversidade e a saúde do ecossistema local.

    A ciprofloxacina apareceu em amostras de biota, mas nas concentrações encontradas nos peixes, não representa risco para a saúde humana. A pesquisa alertou, porém, que é fundamental monitorar a acumulação desses compostos nos alimentos consumidos pela população local.

    Silvani enfatizou que a presença desses contaminantes afeta diretamente a vida local. Os impactos ecológicos são preocupantes, principalmente para peixes e outros animais, podendo interferir na reprodução e causar toxicidade.

    Ela ressaltou a necessidade de regulamentos para estabelecer limites claros para esses compostos. O monitoramento constante é essencial para minimizar os riscos.

    Drogas ilícitas

    O estudo também mapeou a presença de drogas ilícitas, como cocaína. A equipe já havia investigado a droga em grandes animais marinhos, como tubarões. Silvani comentou que, embora os resultados completos ainda não tenham sido divulgados, a quantidade encontrada foi expressiva, com concentrações acima da média mundial.

    Próximos passos

    A pesquisa realizada com o apoio da Fapesc está em sua fase final, mas suas descobertas podem impactar a regulação ambiental e a qualidade do saneamento básico. O laboratório da UFSC desenvolve soluções piloto para aprimorar o tratamento da água e eliminar contaminantes, como o sistema REACQUA, que usa luz solar para purificar a água sem consumo de energia.

    Sistema REACQUA, que gera água pura para reuso sem consumo de energia. Foto: Gustavo Diehl/Agecom/UFSC

    Silvani explicou que, embora existam processos caros, como o uso de membranas no final do tratamento, a proposta é buscar soluções mais baratas. O REACQUA mostrou resultados excelentes no tratamento das águas contaminadas da Lagoa da Conceição, eliminando os contaminantes.

    * Fonte: UFSC

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