A procuradoria do município de Florianópolis enviou “notificação extrajudicial” ao Correio de Santa Catarina para pedir que o jornal se abstenha de afirmar que a terceirização da coleta de lixo promovida pelo prefeito, Gean Loureiro (DEM), é “irregular“.
Segundo a notificação, “não há qualquer ilegalidade que recaia sobre a contratação da empresa Amazon Fort, bem como que inexiste qualquer vedação legal ou judicial a terceirização dos serviços outrora prestados pela COMPCAP (sic)“. A notificação afirma que se a reportagem impressa não for corrigida “serão tomadas as providências judiciais cabíveis” em 24h, isso em um jornal que é semanal.
Assim, a prefeitura pediu ao Correio o “direito de resposta”. Cabe ressaltar que ao longo dos anos por diversas vezes a Prefeitura de Florianópolis, sob a gestão de Gean, não respondeu questionamentos simples do jornal Correio e tampouco mandou informações atualizadas sobre a pauta latente na cidade, para depois exigir direito de resposta.
A afirmação do Correio tinha como base a decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 12ª região de 1º de setembro, que determina que a prefeitura, que controla a Comcap, não continue com a terceirização e cesse os contratos com a Amazon Fort:
“Ainda, porque respaldada tal obrigação pelo ACT 2019/2021, condeno a demandada [Comcap] ao cumprimento de obrigação de não fazer, abstendo-se de promover terceirização de sua força de trabalho que não seja autorizada pela cláusula 27ª daquele Acordo Coletivo, sob pena de incidência de multa de R$100.000,00 por mês, por trabalhador mantido nessa situação irregular.”
” Abster-se de promover terceirização não autorizada pela Cláusula 27ª do Acordo Coletivo de Trabalho 2019/2021, sob pena de incidência de multa de R$100.000,00 por mês, por trabalhador mantido nessa situação irregular.“
A procuradoria afirma que não houve determinação de cumprimento imediato quanto à condenação da Comcap em fazer a terceirização não autorizada pela cláusula 27ª do acordo coletivo de trabalho e que não fez parte da lide em decidir frente à qualquer situação específica, se terceirizações eventualmente em curso são ou não lícitas.
A procuradoria também atualizou o Correio – e não a secretaria de comunicação, que dificilmente dá explicações completas – a respeito do entendimento mais recente do TRT, de 7 de setembro, que afirmava que não há proibição ao município para proceder a contratação de empresa particular para a prestação dos serviços de coleta de resíduos. Sendo assim, por ora, a terceirização em Florianópolis não está irregular. Portanto a informação publicada no impresso Nº 915 do Correio estava errada, não por falta de busca por informações atualizadas. O jornal também havia questionado o TRT, sem resposta sobre a mais recente decisão, antes de publicar a matéria.
Gean tem muito a explicar
O prefeito Gean Loureiro é quem se abstém de explicar os problemas decorrentes da terceirização da coleta de lixo. Cabe ao prefeito explicar por que está insistindo em terceirizar contratos sem licitação com a mesma empresa. Ele se esquiva do assunto e o Correio tem conseguido pequenas explicações da prefeitura. É provável que Gean não dê aos cidadãos da capital do estado o merecido esclarecimento; se o fizer; talvez seja através de outro veículo de comunicação, como é usual.
Para tentar justificar contratos sem licitação, a prefeitura colocou no portal de transparência que era uma situação “emergencial”, o que não explica de fato ao contribuinte florianopolitano a assinatura de mais um contrato de R$ 2,69 milhões. Recentemente o TCE multou um subsecretário da prefeitura de Florianópolis por prática similar, em um contrato ainda maior.
O Tribunal de Contas do Estado também avalia se esses contratos com a Amazon Fort estão corretos e já indicou que há problemas nessas despesas do município. Nada de juridicamente irregular na insistência da terceirização até agora, mas em 28 de setembro pode haver novo entendimento do TRT, prazo para recursos na ACP 0000050-25.2021.5.12.0036.
Nem só de brigas judiciais na coleta do lixo vive a gestão de Gean Loureiro. Há outros assuntos silenciados no debate público e que o Correio de Santa Catarina está trazendo à tona: a indicação de corrupção na Secretaria de Meio Ambiente deflagrada na Operação Entulho e a tomada de dívida de R$ 570 milhões que Loureiro quer fazer sem esclarecer quanto isso vai custar ao contribuinte municipal. Em outras ocasiões, quando pediu autorização de empréstimo à Câmara de Florianópolis (e a base de vereadores aceitou), o prefeito não revelou o custo real do empréstimo arcado pelo contribuinte, como se o dinheiro não fosse público.
O Correio fez novos questionamentos sobre alguns dos problemas da gestão, como o caso de corrupção na Secretaria de Meio Ambiente e por que essa pasta, tocada pelo ex-vereador Fábio Braga, escolheu duas vezes a Amazon Fort para executar (de forma precária até agora) o serviço da Comcap. Confira as repostas da gestão que exige “direto de resposta” e que não responde de forma satisfatória:
1) O que a prefeitura tem a dizer sobre o caso de corrupção na Secretaria de Meio Ambiente (Operação Entulho)?
R: A Prefeitura de Florianópolis desconhece tal alegação junto à Secretaria Municipal do Meio Ambiente.
A reportagem já sondou que novas prisões poderão ocorrer no âmbito dessa operação policial, oriunda do Ministério Público de Santa Catarina para frear a ocupação desordenada do solo da ilha.
2) Por que a prefeitura considera uma situação “emergencial” para não licitar a coleta de lixo e por que a prefeitura escolheu novamente a Amazon Fort?
R: A Prefeitura de Florianópolis informa que a licitação já está em processo e deve ser publicada neste mês. A emergência se dá por conta da redução dos temporários por término do contrato e a necessidade de manter os serviços.
Não foi respondido a respeito da escolha repetida pela Amazon Fort.
3) Como ficará a taxa de lixo no ano que vem?
R: A Secretaria Municipal da Fazenda de Florianópolis informa que não haverá qualquer modificação com relação ao que já foi feito neste ano. A economia gerada com a terceirização está sendo direcionada em investimentos de novos tipos de coleta e ecopontos, tornando Florianópolis referência na destinação correta de resíduos.
Fica exposto aqui que a tarifa da coleta de lixo no próximo ano não ficará mais leve para o contribuinte municipal com a dita “economia”. Se houver, vai ser gasto com outras ações de coleta de lixo, que sempre foi de forma exemplar executada pela Comcap. A “economia” de Gean com a terceirização não será revertida para o munícipe, ele vai manter a cobrança sem desconto. A lei de terceirização foi aprovada sob as desculpas de cortar privilégios na Comcap e “economizar R$ 20 milhões”.
Somente em contratos da Amazon já foram despejados mais de R$ 4,2 milhões do erário municipal na empresa até agora. Para conseguir afirmar que haverá uma economia, Gean precisa cortar mais ainda os salários dos garis e motoristas da Comcap, que para ele eram “privilegiados”.
A história ainda terá muitos capítulos e o Correio continuará em busca das informações mais transparentes e atualizadas para trazer às pessoas de Florianópolis.
Por Lucas Cervenka – reportagem@correiosc.com.br