O estado de Santa Catarina tem um longo histórico de conceder benefícios fiscais. Até hoje não se sabe exatamente quais são, nem mesmo os órgãos designados ao controle – o Tribunal de Contas do Estado e o Ministério Público de Contas (MPC).
Nesta semana o Tribunal de Justiça de Santa Catarina de novo determinou que a Secretaria Estadual da Fazenda libere ao MPC o acesso integral aos dados de arrecadação tributária e de benefícios fiscais concedidos pelo poder executivo. Essa determinação reitera o que já foi acordado em 2019 com um termo de ajuste de conduta, que até agora não foi cumprido pelo governo do estado, de acordo com o TJSC.
“A postura administrativa, sem dúvidas, desperta atenção e receio, sobretudo no contexto atualmente experimentado de crise sanitária com repercussões econômicas significativas. Afinal, somente duas razões podem explicar a restrição do acesso do MPC-TCE às informações de arrecadação tributária e de incentivos fiscais: ou a ineficiência dos setores responsáveis por tal compartilhamento, ou interesses escusos e não republicanos com o desígnio de esconder ilegalidades e manter benefícios indevidos”, disse o desembargador Ronei Danieli ao analisar o pedido de acesso.
Em 2019, com entrada de novo governo, a revisão dos benefícios fiscais passou a ser uma pauta importante, tanto para o poder executivo, quanto para o legislativo. O secretário da Fazenda, Paulo Eli, que já vinha da gestão anterior, chegou a criticar em audiência na Alesc a concessão desenfreada de benefícios fiscais todos os dias “como se fosse pão quente”, em suas palavras. O próprio governo afirmava, naquele ano, que os benefícios fiscais concedidos em 2018 em Santa Catarina totalizaram R$ 5,8 bilhões, correspondendo a 25% da receita estadual e que seriam reduzidos para 2019.
Em 2020, o secretário reiterou que não concederia mais benefícios fiscais sem o respaldo legal – isto é, que o governo parasse de conceder benefícios ilegais, principal motivo de auditação das contas públicas estaduais por parte do MPC.
Mas, também no ano passado, a Alesc rejeitou projeto de lei que aumentava a transparência e análise sobre os benefícios fiscais para 2021. Uma das operações recentes de concessão de benesses fiscais à uma empresa foi para o Mercado Livre instalar um centro de logística em Governador Celso Ramos. Não há qualquer indício que as regalias fiscais concedidas para o Mercado Livre se instalar em Santa Catarina tenham sido ilegais, mas o governo não quis revelar o que ofereceu à empresa, alegando sigilo fiscal.
A decisão recente do TJ obrigando o poder executivo a dar acesso ao MPC aos dados contábeis só reforça algo que já é obrigatório, mas o órgão de controle teve de entrar, há mais de um ano, com um mandado de segurança para conseguir de fato esse acesso. Uma das alegações iniciais do Estado para o não fornecimento das informações era o sigilo fiscal – como se o contribuinte não pudesse saber o que é feito com o dinheiro e a gestão pública. Conforme proclamado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), “o sigilo fiscal não pode ser alegado perante o Tribunal de Contas da União para negar dados e informações necessários aos trabalhos de auditoria”.
Caso o poder público executivo continue a descumprir a lei e o termo de ajuste de conduta, há uma multa para o governo (isto é, ao contribuinte catarinense) de R$ 20 mil por dia, até o limite de R$ 400 mil.
Em sua decisão, Danieli afirmou que não encontrou justificativa minimamente plausível para o descumprimento das medidas e a negativa em dar acesso aos dados de arrecadação e administração tributária.
Por Lucas Cervenka – reportagem@correiosc.com.br